Quem vive em centros urbanos e está acostumado a circular pelas cidades – e sofrer na pele com o tempo perdido no trânsito -, talvez nem imagine toda a ciência e o planejamento envolvido nas soluções de locomoção. Seja de carro, a pé ou transporte coletivo, qualquer cidade tem como uma das pautas principais para melhoria e evolução a mobilidade urbana, mas afinal de que se trata?
- O que é mobilidade urbana?
- Qual o objetivo da mobilidade urbana?
- Mobilidade Urbana no Brasil
- A crescente crise da mobilidade urbana brasileira
- Mobilidade urbana também é questão ambiental
- Como melhorar a questão da mobilidade urbana no Brasil
- Mobilidade urbana sustentável
- Aplicativos de mobilidade urbana
- Existe uma lei de mobilidade urbana?
- Mobilidade urbana: por que investir?
O que é mobilidade urbana?
Durante o dia, o comércio, as escolas, os hospitais; à noite, os bares, teatros, cinemas. A vida nas grandes cidades é dinâmica ao longo de 24 horas e até quando quase todos dormem, ambulâncias e viaturas circulam. Para que todo esse movimento flua sem entraves, é preciso que haja mobilidade urbana.
Mobilidade urbana é, portanto, o deslocamento de um ponto a outro dentro de uma cidade para atividades econômicas ou sociais. E, na explicação literal, “mobilidade” significa a capacidade de se mover, e “urbana” é relativa à cidade. Mesmo sem saber em detalhes desse conceito, com certeza você pensou na localização e na mobilidade urbana quando estava procurando um imóvel para comprar.
Qual o objetivo da mobilidade urbana?
O principal objetivo da mobilidade urbana é facilitar o ir e vir das pessoas, mercadorias e cargas através de infraestrutura e logística que permitam o trânsito fluido. A mobilidade urbana deve ser planejada de uma forma que contribua para a qualidade de vida da população e incentive o rápido deslocamento dentro da cidade.
Em grandes metrópoles, como São Paulo e Rio de Janeiro, é muito comum o debate sobre mobilidade urbana, principalmente pelos órgãos públicos que precisam resolver problemas como congestionamento e melhorias nos sistemas de transporte público, que impactam diretamente na qualidade de vida de seus moradores.
Mobilidade Urbana no Brasil
A necessidade de pensar a mobilidade urbana no país se dá no início do processo de urbanização das cidades, na década de 1930, quando estas começam a ficar cada vez mais populosas com a chegada das indústrias no Brasil.
Com a ida das pessoas do campo para as cidades em busca de trabalho e condições melhores de vida, os centros industriais começaram a ficar cada vez mais populosos, o que consequentemente intensificou a circulação de pessoas, além do transporte de cargas. Nesse primeiro momento, as indústrias foram instaladas principalmente na região Sudeste e, até hoje, essa é a região que mais apresenta problemas de mobilidade urbana, mas não a única, afinal a industrialização se espalhou para outras regiões também.
O problema aparece quando a migração das pessoas para essas regiões extrapola a oferta de emprego, alimentação, moradia e lazer, o que leva muitas a trabalharem longe de casa para sobreviverem. E aí vem a necessidade de fazer o planejamento de mobilidade urbana pois, quando isso não acontece, perde-se tempo: dados da pesquisa “Viver em São Paulo: Mobilidade Urbana”, feita em 2020 pela Rede Nossa São Paulo, em parceria com o Ibope Inteligência, indicam que 26% da população paulistana gasta mais de 2 horas em deslocamentos diários. Na prática, mais do que tempo, isso representa perda de qualidade de vida, saúde, trabalho e bem estar.
Com os centros urbanos cada vez mais populosos, surge outro fenômeno, que é o da verticalização. Como o crescimento não podia ser mais horizontal, a alternativa foi melhorar o planejamento urbano com o crescimento vertical. A verticalização só passa a ser possível a partir do século 19, devido a algumas tecnologias como o elevador e as estruturas de aço.
Hoje, estima-se que o custo socioeconômico da mobilidade urbana no Brasil seja de R$ 483,3 bilhões anuais, de acordo com a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). Um número que aponta para uma crise aparentemente sem solução.
A crescente crise da mobilidade urbana brasileira
Esse aumento da população nas cidades e centros urbanos e o aumento do uso de carros particulares vem provocando uma crescente crise da mobilidade urbana no Brasil. Entre 2006 e 2021, o IBGE registrou uma evolução da frota brasileira, que passou de pouco mais de 45 milhões de unidades para as atuais 111,4 milhões.
Se observarmos os dados da pesquisa realizada pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e pela Webmotors, fica fácil entender porque o problema está numa crescente. De acordo com o levantamento, 95% das pessoas possuem interesse em comprar carro. Considerando que, em 2021, esse interesse estava apenas um ponto acima, em 2022, ele permaneceu estável.
Se, por um lado, a opção pelo transporte individual é uma das principais causas da falta de mobilidade, por outro os transportes públicos não funcionam como deveriam, com veículos de baixa qualidade, estrutura sucateada e ainda uma frota insuficiente para atender à população nos horários de pico. Além disso, as pessoas se sentem mais seguras e protegidas dentro de seus veículos do que em metrôs, trens e ônibus, onde assaltos e assédios são mais comuns do que deveriam.
Neste cenário, é fácil deduzir o porquê de algumas pessoas não abrirem mão da autonomia e conforto do automóvel próprio, contribuindo para agravar o problema da mobilidade urbana brasileira.
Mobilidade urbana também é questão ambiental
É importante compreender ainda os impactos ao meio ambiente causados pela enorme emissão de gases tóxicos pelos automóveis movidos a diesel e álcool, ou seja, mais um agravante que está relacionado com a mobilidade urbana. Os carros são vilões do efeito estufa, já que emitem uma enorme diversidade de substâncias tóxicas, sendo os mais nocivos o Monóxido de Carbono (CO); o Dióxido de Carbono (CO2); o Ozônio (O3); o Óxido de Nitrogênio (NOx); o Dióxido de Nitrogênio (NO2); os Hidrocarbonetos (HC); os Óxidos de enxofre (SOx) e o Material Particulado (MP).
Segundo o Inventário de Emissões Atmosféricas do Transporte Rodoviário de Passageiros no Município de São Paulo, os carros são responsáveis por 72,6% da emissão de gases do efeito estufa e realizam o transporte de apenas 30% da população.
Além dos impactos para o meio ambiente existe o impacto para a população: a Organização Mundial de Saúde (OMS) já alertou e segue alertando que a poluição causada pelos automóveis pode aumentar o risco de morte devido a problemas cardiopulmonares. Como nem todo mundo pode fugir para longe da fumaça e dos engarrafamentos, é preciso encarar o problema de frente em busca de soluções que funcionem para todos.
Como melhorar a questão da mobilidade urbana no Brasil
Para melhorar o problema da mobilidade urbana é necessário que o poder público, as grandes empresas e a população caminhem de mãos dadas, afinal todos fazem parte do processo e precisam tomar decisões e fazer escolhas que interferem no coletivo. Além disso, devem buscar maneiras eficientes de usar os espaços urbanos e preservar o meio ambiente.
Algumas medidas podem ser tomadas, tais como:
- Criar uma rotina que permita alternar e diversificar o uso dos meios de transportes (carros, bicicletas, ônibus, motocicletas);
- Alternar os horários de atividades urbanas, como abertura e fechamento do comércio em uma hora e entrada e saída das escolas em outro horário;
- Incentivar as caronas coletivas, uma vez que um carros com mais passageiros atravancam menos as vias do que vários carros com passageiros solitários;
- Integração entre os transportes públicos, pois quando se gasta uma passagem única para se locomover entre trem e metrô, a diferença se sente no bolso.
O home office, intensificado nos últimos anos devido à pandemia, também é um fenômeno que apresenta vantagens para a mobilidade urbana, já que diminui a presença de pessoas nas ruas se deslocando para o trabalho.
Antes de chegar nas medidas, entretanto, a discussão sobre o tema é urgente. Se um dos maiores problemas da mobilidade urbana do país está relacionado com as questões ambientais, o mais importante no momento é buscar maneiras de diminuir as emissões de gases tóxicos dos carros. Em janeiro de 2022, entrou em vigor a nova fase do Programa de Controle de Emissões Veiculares (ProconVe), administrado pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que determina que os automóveis comercializados em 2022 deveriam poluir menos que os vendidos até 2021. Medidas como essa indicam que as iniciativas podem e devem partir de todos os segmentos da sociedade e apontam para uma mobilidade urbana sustentável é sim, possível.
Assim como a melhoria do transporte público é essencial para melhorar a mobilidade urbana nas grandes cidades, serviços próximos às moradias também ajudam – e muito – na redução dos deslocamentos. Uma saída seria incentivar, por exemplo, prédios com fachada ativa, aqueles com mercadinho de bairro, padaria ou loja no térreo, voltados para a calçada, com portaria ao lado para a entrada de moradores dos andares superiores.
O urbanista Fernando de Mello Franco, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e ex-secretário de Desenvolvimento Urbano de São Paulo, explica que o que está por trás do conceito da fachada ativa é algo muito antigo: a busca pela convivência. “Se eu for a pé até a padaria que fica na esquina, esse caminhar precisa ser qualificado: enquanto eu vou na padaria, eu passo na lavanderia, pego a roupa que ficou pra lavar e faço outros serviços, então essa dinâmica não depende do carro, mas das relações de proximidade, que em Paris estão chamando de cidade de 15 minutos – eu resolvo minha vida a 15 minutos a pé da minha casa, sem queimar combustível, melhorando as questões climáticas. Com isso, tenho mais saúde, porque é muito melhor ir a pé para a padaria do que de carro e criando um bairro mais dinâmico”.
Mobilidade urbana sustentável
Para melhorar a questão da mobilidade urbana no Brasil e, ao mesmo tempo, contribuir para uma alternativa sustentável, certas medidas já estão sendo tomadas.
Algumas cidades têm incentivado e conscientizado a população quanto à redução do uso dos transportes individuais, priorizando transportes “limpos” como bicicleta e os que usam energia renovável, como é o caso do VLT Carioca, do Rio de Janeiro. Já o metrô de São Paulo, por exemplo, adquiriu novos trens equipados com uma tecnologia mais avançada, a fim de diminuir o consumo de energia.
Outra alternativa que vem ganhando destaque é a do carro elétrico, que são veículos que trocam o consumo de combustível fóssil (como gasolina e diesel) pela energia elétrica. Esse tipo de tecnologia vem crescendo cada vez mais porque está de acordo com os princípios ESG de desenvolvimento social, pauta que também entrou numa crescente nos últimos anos para empresas que valorizam a inovação.
Segundo dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (FENABRAVE), foram emplacados 32.242 veículos eletrificados no país, registrando uma alta de 41,75% em relação ao mesmo período de 2021. Justamente por isso, os postos brasileiros estão começando a se preparar para a chegada desses veículos eletrificados, começando a instalar pontos de recarga, os chamados eletropostos.
Aplicativos de mobilidade urbana
Outra solução para o melhor funcionamento do trânsito é o uso dos aplicativos de mobilidade urbana. É o caso do Waze, um aplicativo baseado em navegação por GPS que conta com alimentação colaborativa, isto é, feita pelos próprios usuários. Na prática, além de indicar qual o trajeto mais livre e mais rápido, o aplicativo também sinaliza quando há problemas estruturais nas vias e outras informações que contribuem para uma decisão que facilite o trajeto do usuário.
Há também os aplicativos das prefeituras, como o ÔnibusSP (São Paulo capital) e outros como Moovit e CittaMobi, que indicam os horários dos ônibus, trens e metrôs. Além deles, os aplicativos de transporte particular têm sido uma alternativa para quem não quer ter gastos e preocupações com um carro próprio.
Existe uma lei de mobilidade urbana?
Há 10 anos entrou em vigor a Lei da Mobilidade Urbana, que institui a Política Nacional de Mobilidade Urbana. Entendendo que o planejamento urbano é uma ferramenta extremamente necessária para o crescimento sustentável das cidades brasileiras, a lei estabelece diretrizes para o desenvolvimento urbano, buscando integrar, melhorar e tornar mais acessíveis todas as modalidades de transporte, seja para circulação de pessoas ou de cargas.
Alguns pontos presentes na Lei de Mobilidade Urbana indicam como podemos, individualmente, agir e cobrar em prol dessa necessidade coletiva:
- Priorizar transporte público coletivo e os projetos desta modalidade: aqui, a lei estimula o investimento em veículos capazes de transportar um maior número de pessoas por vez para que o transporte individual (mais poluente) seja a exceção;
- O poder público poderá estabelecer restrição, controle de acesso e circulação, temporária ou permanente, de veículos motorizados em determinados locais: em ocasiões ou vias específicas, o trânsito pode ser modificado para priorizar o livre acesso de pedestres, bicicletas e outros modais menos poluentes;
- Definição de espaços exclusivos nas vias públicas para o transporte público coletivo de passageiros: aqui, estamos falando de corredores exclusivos para a circulação de VLTs e BRTs, que desafogam as vias principais;
- É permitido o subsídio tarifário, o qual deverá ser coberto por receitas extra-tarifárias, receitas alternativas, subsídios orçamentários ou subsídios cruzados intrasetoriais e intersetoriais: é a Lei de Mobilidade que trata da permissão que os entes têm para cobrar a tarifa de acordo com o tipo de transporte e explica que esse valor não pode ser repassado ao passageiro sem critério;
- O poder público é obrigado a divulgar de forma sistemática e periódica os impactos das gratuidades no valor da tarifa paga pelo usuário: também é essa lei que explica que as gratuidades concedidas a idosos e outros passageiros em situações especiais não saem de graça e são custeadas pela coletividade.
Mobilidade urbana: por que investir?
Seja para trabalhar, pegar uma praia, ir ao cinema ou realizar atividades como ir ao mercado e ao médico, você vai precisar se locomover. Em alguns horários e dias essa tarefa simples de sair de um lugar para outro pode ser extremamente estressante. Investir em mobilidade urbana é compreender que este planejamento pode impactar em todo um ecossistema que move, literalmente, um centro urbano.
Um bom plano de mobilidade urbana deve atender e facilitar o deslocamento da população. Com um trânsito funcional, as pessoas acabam tendo uma melhor qualidade de vida e rendimento em todas as áreas da sua vida, seja encurtando ou tornando mais confortável o trajeto do trabalho para casa, sobrando mais tempo para a família, para lazer, estudos e descanso. A mobilidade urbana também é conscientizar a população sobre a melhor escolha que beneficia o bem estar coletivo e o meio ambiente.
Colaboração de Michele Louvores
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