Além do planejamento financeiro, o sonho da casa própria requer também uma boa dose de organização. Isso porque conferir detalhadamente a documentação atrelada ao imóvel é uma etapa crucial do processo. Se imóvel for no Rio de Janeiro, é necessário ter ainda mais cautela durante a preparação para comprar (ou vender) uma propriedade. Segundo a supervisora de Diligência Imobiliária da Loft, Marcella Perestrelo, os campeões na lista de entraves para adquirir um imóvel em terras fluminenses são os prazos para liberação de certidões e as taxas cuja obrigatoriedade ainda são pouco conhecidas pela maioria da população.
“As taxas de incêndio, do condomínio e as dívidas com o IPTU costumam gerar problemas porque muita gente desconhece que estão vinculadas aos imóveis. Além disso, no Rio, são exigidos mais documentos se compararmos com o que é cobrado no estado de São Paulo, por exemplo. Os prazos para emissão de certidões junto aos órgãos também são mais extensos e caros. Então, todo processo requer ainda mais atenção”, observa.
A supervisora esclarece que um dos primeiros passos para a aquisição de uma propriedade é a obtenção da Certidão Negativa de Débitos (CND), documento referente aos débitos de impostos que uma propriedade ou um indivíduo pode ter junto ao Município. A CND deve ser retirada na prefeitura, com prazo mínimo de cinco dias úteis, e sua liberação depende que não haja nenhuma pendência, como dívidas de IPTU, por exemplo.
A taxa de incêndio é obrigatória
A cobrança do Fundo Especial do Corpo de Bombeiros (Funesbom), popularmente conhecido como a “taxa dos bombeiros” ou “taxa de incêndio”, está prevista no Código Tributário do Estado e destina-se ao reequipamento da corporação nas áreas de salvamento e combate de incêndio. A cobrança é polêmica no país e já rendeu, inclusive, discussão no Superior Tribunal Federal (STF) sobre sua legalidade. O debate gerou dúvidas entre os contribuintes, mas Marcella Perestrelo reitera que o tributo anual segue obrigatório no estado do Rio de Janeiro e sua inadimplência pode acarretar em inscrição na dívida ativa, a lista de negativados do governo.
Para checar a situação do imóvel e verificar a necessidade de resolver algum passivo, é possível acessar o site da corporação. A página oferece opções para atualização cadastral, consulta de débitos, solicitação de parcelamento, emissão de segunda via da Funesbom, entre outros serviços.
Quem paga as dívidas condominiais?
Se comprou um apartamento com dívidas de condomínio, não tem escapatória: este tipo de pendência está ligado ao imóvel e, em caso de transferência de propriedade, é o novo dono que assume a responsabilidade de pagamento. Para evitar surpresas e dívidas inesperadas, é possível consultar os débitos por meio da emissão de certidão negativa emitida pela própria administração da propriedade. Este é um documento importante e não pode ser ignorado durante as tratativas para aquisição de um bem.
“Comprar um imóvel é um sonho e quando você lida com sonhos é fundamental administrar as emoções. Agir com a razão torna o sonho mais palpável. Por isso, fazer uma diligência minuciosa e atenta dos documentos do imóvel reduz significativamente o risco do negócio”, recomenda a supervisora.
No caso de optar por manter a compra do imóvel mesmo ciente das dívidas condominiais, um caminho possível é a negociação direta com a administração do local. Na maioria das vezes a dívida de condomínio pode ser parcelada e o sucesso da renegociação evitará que o imóvel vá, em última instância, parar em leilão.
De acordo com decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a dívida de condomínio prescreve depois de cinco anos, mas atenção: prescrever não significa desaparecer. A pendência não deixa de existir e pode ser cobrada mesmo depois deste prazo. A diferença é que, após o período de prescrição, o credor não pode mais acionar os meios judiciais para efetuar a cobrança. Mas solicitações amigáveis, por meio do telefone, por exemplo, podem ser feitas sem ferir a legislação. Além disso, o nome do devedor ainda pode ser incluído na lista de proteção ao crédito.
IPTU em dia
Outra taxa atrelada ao imóvel é o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU). Ter uma dívida de IPTU não inviabiliza o processo de compra e venda de uma propriedade, mas permanecer em situação de inadimplência pode acarretar em inscrição do proprietário na dívida ativa do município e gerar cobrança judicial por meio de bloqueio de contas e até penhora do imóvel.
Em caso de não ter recebido nenhuma cobrança, saiba que as dívidas de IPTU prescrevem depois de cinco anos. Este é o prazo que o município tem para acionar judicialmente o devedor. Para saber a condição do imóvel e verificar se a sua propriedade está em dia com o tributo, basta procurar a prefeitura. É possível solicitar parcelamentos e negociar a pendência, inclusive, com descontos.
Matrícula e certidão de imóvel: mantenha atualizados
Muita gente ignora essa obrigatoriedade, mas as atualizações dos imóveis também devem ser formalizadas. Segundo o advogado especialista em Direito Imobiliário, Carlos Fernando Barbosa das Neves, sócio do escritório Barbosa & Andrade Advogados, é comum que as pessoas não cumpram esta exigência e existem situações em que as pendências imobiliárias são descobertas, inclusive pelos proprietários, apenas no momento da emissão das certidões, quando decidem vender. Isso gera atraso no processo como um todo e pode implicar, inclusive, no cancelamento do negócio. Mas está longe de ser o único problema. “É frequente a falta de atualização junto aos bancos. Os financiamentos são quitados e, por esquecimento, as pessoas não dão baixa na matrícula ou na averbação do estado civil junto dos proprietários no Registro Geral de Imóvel”, exemplificou o especialista. Por isso, é importante atualizar a matrícula do imóvel quando terminar o financiamento.
A matrícula do imóvel citada pelo advogado é uma espécie de raio-x da propriedade. Nela constam todas as informações necessárias para a obtenção de um panorama sobre o patrimônio: localização, metragem, nome completo, CPF e estado civil do proprietário, entre outros. Além disso, na matrícula atualizada do imóvel ficam registradas (as chamadas averbações) todas as transações que a propriedade sofreu, como compra e venda, ações judiciais e inventários. É um tipo de histórico completo e fica disponível para consulta no Cartório de Registro de Imóveis. Basta ter em mãos o número da matrícula.
No cartório também é possível retirar a certidão de matrícula de imóvel, o documento que reproduz o conteúdo da matrícula de imóvel. Peça obrigatória para se atestar as informações da propriedade ou solicitar um financiamento, por exemplo.
“Deve se ter em mente que aquisições dependem de um profundo levantamento da situação do imóvel e de seus proprietários, sendo necessária a apresentação das certidões inerentes ao imóvel e aos vendedores, para que se tenha plena ciência da existência de dívidas, penhoras ou algum outro empecilho que possa ocasionar oposições de terceiros após a venda”, explicou Carlos Fernando Barbosa das Neves.
Fez obra sem licença? Problema à vista
A construção do telhado da garagem, a ampliação da suíte ou qualquer outro acréscimo de área edificada que altere o tamanho ou a estrutura do imóvel pode virar dor de cabeça se a reforma não estiver legalizada. Isso porque qualquer incompatibilidade de informações entre a metragem do imóvel e o que está lançado no Registro de Imóveis vai impossibilitar futuras transações, pode gerar multas e até demolições. “Este é um exemplo clássico, as pessoas constroem áreas de lazer sem a devida averbação e acréscimo na matrícula do RGI. Isso inviabiliza a liberação de financiamentos bancários, devido às divergências de informações”, alerta Neves.
Como registrar a reforma
O primeiro passo para solucionar a pendência é o proprietário procurar a prefeitura, via Secretaria de Urbanismo, para dar início ao processo de regularização. Importante ter em mente que a construção deve respeitar os critérios urbanísticos estabelecidos para a região. Para dar início ao processo será necessário apresentar os seguintes documentos: a Certidão de Ônus Reais do imóvel, o projeto da obra assinado por arquiteto ou engenheiro civil, além da documentação do proprietário. Em situação de falecimento, o inventariante pode ser responsável pela legalização.
O processo junto ao Município inclui análise dos documentos, vistorias técnicas, cumprimento de possíveis exigências e o pagamento do Imposto Sobre Serviços (ISS). A regularização se encerra com a liberação da certidão de visto fiscal e do Habite-se, um atestado de que a alteração no imóvel foi aprovada e segue todas as regras do município. O Habite-se deve ser registrado no Cartório de Registro de Imóveis.
Colaboração de Mariana Jucá
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