Passados 3 anos do início da pandemia, mudamos completamente a nossa relação com a casa. O dia a dia atribulado e o trabalho prioritariamente presencial nos roubavam muito tempo dentro de casa. Agora, com o afrouxamento das restrições e a expansão do trabalho remoto, a realidade é outra. A casa voltou a ser o nosso "lar doce lar''.
Na verdade, a pandemia apenas reforçou uma tendência que já vinha se mostrando forte globalmente. Pesquisas indicam que ao longo dos anos nós estamos passando cada vez mais tempo em casa. Os americanos passaram 8 dias a mais em casa em 2012 na comparação com 2003. Já os jovens de 18 a 24 anos passam 70% mais tempo em casa que o restante da população.
Além da COVID-19, que certamente deixou como um legado um maior apego à casa, outros fatores também contribuem para esse comportamento. O avanço da tecnologia, que nos permite trabalhar remotamente com a mesma eficiência do trabalho presencial, é um dos fatores mais importantes desse movimento. Foi graças a ele que vimos surgir modelos de trabalhos mais flexíveis e que agora se expandem em função dos aprendizados da pandemia. Mas a questão econômica também tem influenciado muito na nossa decisão de passar mais tempo em casa.
Se a pandemia nos ensinou que precisávamos aprender a nos divertir dentro do espaço limitado das nossas casas, a crise econômica que se seguiu tem mostrado que também é mais barato. O desembolso com bebidas em bares e restaurantes, por exemplo, é bem mais alto do que no supermercado. Por isso, em casa podemos beber mais pagando menos e ainda economizando com o deslocamento. Além disso, os serviços de delivery de comida e bebida facilitaram muito essa transição.
Mas essa nova dinâmica não provocou mudanças somente no âmbito da casa, os espaços públicos também têm se reconfigurado para mimetizar o aconchego e o conforto do lar. Alguns exemplos dessa tendência podem ser vistos em lojas, hotéis e até mesmo nos carros. O novo BMW Vision Next, por exemplo, é revestido de madeira marchetada, suede rosa e tem um display que mais parece uma TV.
O Hotel Life House Little Havana, em Miami, instalou cortinas nos boxes das camas para garantir a privacidade e trazer mais conforto para os hóspedes.
Mas quem se superou mesmo foi a Flagship Store da John Lewis, na Oxford Street, em Londres. No 3º andar da loja de departamentos foi inaugurado, no ano passado, o The Residence, um flat luxuoso com cozinha, suíte de casal e sala de jantar, onde os clientes podem passar a noite desfrutando de todos os itens da loja, da decoração à roupa de cama. Com isso, a loja espera um aumento nas vendas já que oferecem a experiência de experimentar os itens antes do momento decisivo da compra.
Mas se você não tem a noite toda livre, pode tirar uma "soneca" de 2 horas na sessão de cama, mesa e banho da loja, com direito a pijama, fone de ouvido com noise cancelling, lençóis de linho e até uma sessão de massagem. É claro se você não se importar com o fato de ser observado pela legião de clientes que continuarão vagando pela loja enquanto você dorme.
Outra tendência são os chamados HOME SHOWROOMS, apartamentos nos quais tudo está à venda, da mobília aos objetos de decoração. Eles estão ficando cada vez mais populares e se tornando um meio eficiente de criar uma experiência única de marca.
Uma parceria da revista de design inglesa Cereal Magazine com a imobiliária Aucoot Real Estate, em Londres, criou uma vivência inédita no mercado imobiliário. A revista decorou a cobertura ofertada pela imobiliária e os clientes interessados na compra do apartamento podiam agendar uma estadia para experimentar como seria morar ali antes de tomar a decisão de compra.
Outro casamento que deu frutos foi o da imobiliária australiana Microluxe Property com o Airbnb, em Melbourne, na Austrália: um apartamento de aluguel temporário super bem decorado onde os hóspedes podem comprar tudo quando fazem o check-out. Uma espécie de galeria de arte que se renova a cada estadia.
Outro legado da pandemia e da decorrente crise econômica que veio a reboque foi a ocasião de receber em casa. De acordo com o instituto de pesquisas Gfk: ¼ das pessoas recebem amigos em casa diária ou semanalmente e ⅓, mensalmente. Ou seja, mais pessoas estão criando ambientes pensados especialmente para acomodar essa nova função. E o design também muda, já que as pessoas gastam mais tempo e esforço na decoração para exibir suas casas.
Designers estão crescendo seu grau de influência nas redes sociais com perfis ligados a estilos de decoração maximalista de cores fortes, inspirados em bares e restaurantes descolados das grandes metrópoles, como é o caso de Natasha Webb, Evie Kemp e Erica Prince (famosa por seus vasos de formatos inusitados).
Seja dentro ou fora de casa, já não temos mais saída, a casa está em todo lugar. Ela retomou o protagonismo que havia perdido e agora reina absoluta nas nossas vidas. E esse reinado parece que veio para ficar.