Regularizar um imóvel já construído pode, inicialmente, parecer ser uma tarefa burocrática, mas é fundamental para evitar problemas maiores no futuro e garantir certa estabilidade patrimonial e financeira ao proprietário.
Neste tutorial, vamos explicar o passo a passo de como iniciar o processo de regularização de um imóvel residencial já construído em área urbana e a importância de manter o patrimônio imobiliário preservado e em situação de regularidade.
Cada legislação municipal estabelece regras distintas, baseada no seu Plano Diretor – conjunto de leis que orientam o crescimento e o desenvolvimento urbano do município. Por conta disso, a regularização pode exigir documentação distinta, a depender da origem do imóvel.
Por que regularizar um imóvel é importante?
Por se tratar de um bem de grande valor, manter a regularidade do imóvel, para além da preservação do patrimônio, é importante também para evitar o pagamento de multas e outros encargos no município em que a propriedade foi construída.
Os imóveis em situação irregular são mais difíceis de serem vendidos, doados e partilhados em inventários. Nesta condição, o imóvel também sofre mais com a desvalorização no mercado imobiliário.
Cesar Peghini, especialista e professor em Direito Imobiliário, explica que a regularização do imóvel é fundamental por vários motivos, dentre eles garantir a titularidade – que contribui na valorização do bem, ou seja, sabemos que quem possui a propriedade acaba tendo maior segurança jurídica, em casos de compra e venda e abertura de sucessão, por exemplo, e na proteção do seu valor econômico.
Além disso, um imóvel regularizado pode facilitar também no processo para obtenção de crédito, seja utilizando a propriedade como garantia para viabilizar o financiamento ou para ter acesso a um financiamento imobiliário. Peghini ainda reforça que somente é possível a aquisição de imóveis mediante crédito imobiliário se o imóvel estiver em situação de regularidade.
O que é um imóvel regularizado?
Segundo a advogada Andressa Petit Marchi, especialista em Direito Imobiliário e sócia do escritório Petit Marchi Advocacia, um imóvel é considerado regular quando ele preenche os seguintes requisitos:
- Possui matrícula registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente, com todas as informações corretas e atualizadas referentes ao imóvel e às pessoas ligadas ao bem;
- É um imóvel considerado “livre e desembaraçado”, ou seja, não possui restrições ou penhoras que inviabilizam o processo de compra ou venda, por exemplo;
- Não tem nenhuma dívida pendente de pagamento, como débitos de IPTU ou despesas de condomínio;
- Está de acordo com os padrões e as normas de construção civil do município onde está localizado.
Como regularizar um imóvel?
Vários são os motivos pelos quais um imóvel pode estar irregular. Antes de iniciar qualquer trâmite, recomenda-se que a pessoa procure a ajuda de um profissional especializado que irá verificar a situação do imóvel e adotar as medidas cabíveis para cada situação.
Como explica Samuel Duarte, tabelião-substituto no Cartório Paulista, o primeiro passo é verificar a legitimidade da propriedade. Isso significa que é preciso levantar informações para atestar quem tem a posse desse imóvel, seja adquirido por meios de compromissos de venda e compra anteriores ou por contratos particulares.
Toda propriedade precisa ter uma matrícula de imóvel, documento que registra cada propriedade e onde constam informações como localização, dados da propriedade, histórico de compra e venda, informações do(s) proprietário(s), entre outros. A ausência dessas informações na matrícula de um imóvel o deixa em situação de irregularidade.
Caso os direitos de aquisição tenham sido firmados em um contrato particular, Dantas reforça que o caminho mais fácil é identificar as partes envolvidas nesse compromisso para ser feita a escritura pública definitiva e a troca de titularidade do imóvel no registro de imóveis.
Caso as partes envolvidas no contrato não sejam localizadas, o caminho a ser seguido é o outro: o de usucapião, que explicaremos mais abaixo.
Com a escritura em mãos, a matrícula de propriedade emitida ou atualizada, além de outros documentos que atestem a posse do imóvel, e não constando nenhuma pendência, o próximo procedimento é dar entrada para conseguir o Alvará de Regularização na prefeitura de origem em que o imóvel se encontra.
Esse documento valida que a propriedade foi construída seguindo os procedimentos legais estabelecidos. O alvará é válido apenas para imóveis já construídos e suas especificações variam dependendo da localidade, se é um imóvel em área urbana ou rural, entre outras especificações do Plano Diretor definido por cada município.
Com o alvará em mãos, a etapa seguinte é a emissão da Certidão Negativa de Débitos (CND) na Receita Federal. Esse documento comprova que o proprietário está em situação regular com o INSS – condição fundamental para se regularizar um imóvel.
Por fim, com todos os documentos em dia, seja com a prefeitura ou com a Receita Federal, o procedimento seguinte se dará no Cartório de Registro de Imóveis da cidade de origem da propriedade que irá averbar o imóvel. Após isso, o imóvel estará devidamente regularizado.
Quais documentos são necessários para regularizar um imóvel?
Regra geral, para regularizar um imóvel serão necessários documentos de identidade e certidões comprobatórias de estado civil das partes e do imóvel, entre eles:
- Documentos pessoais;
- IPTU;
- Escritura do Imóvel;
- Matrícula atualizada do imóvel;
- Projeto arquitetônico;
- Alvará de construção;
- Alvará de regularização;
- Habite-se do imóvel (documentação que comprova que o imóvel cumpre as normas definidas pelo município e está apto para moradia).
Para a advogada Andressa Marchi, como é possível existirem diferentes tipos de irregularidade – imóveis adquiridos por meio de “contratos de gaveta”, imóveis que não possuem Habite-se, imóveis com construções irregulares ou que necessitem de retificação de área, imóveis rurais que não foram georreferenciados, entre outros – cada situação demanda a adoção de uma medida específica.
Para a Loft, a advogada simulou duas situações para mostrar como a regularização acontece de formas distintas. Ela explica que a análise prévia da matrícula do imóvel é imprescindível para se ter ciência da sua irregularidade e para que sejam tomadas todas as medidas necessárias para a regularização.
Exemplo 1: existência de “contrato de gaveta” – quando o contrato não é oficializado em cartório -, referente a uma compra e venda, sem registro na matrícula do imóvel. Essa situação torna o imóvel irregular.
Segundo a advogada, no Brasil, em se tratando de propriedade imobiliária, quem não registra não é dono. Uma das partes pode quitar o preço do imóvel e guardar o contrato achando que é proprietário do imóvel. Mas não é bem assim.
O problema nessa situação é que, ao analisar a matrícula deste imóvel, o nome do antigo proprietário ainda irá constar como dono deste, caso a transferência de titularidade não seja realizada.
Para resolver esse tipo de caso, as partes envolvidas no exemplo devem começar apresentando uma escritura pública de compra e venda de imóvel ao Tabelionato de Notas, onde a escritura será lavrada. Para isso, os documentos necessários serão: a matrícula atualizada, o contrato celebrado entre as partes, seus documentos e dados pessoais, todas as certidões relacionadas ao vendedor, incluindo a certidão atualizada de estado civil, todas as certidões negativas referentes ao imóvel e comprovante de quitação do preço, por exemplo.
Nesta situação também será necessário o recolhimento do Imposto de Transmissão sobre Bens Imóveis – ITBI. Por fim, com a escritura pública em mãos, ela deve ser registrada na matrícula do imóvel, no Cartório de Registro de Imóveis competente. Somente quando o nome do novo proprietário constar registrado na matrícula do imóvel é que, de fato, ele se tornará dono desse imóvel, deixando-o devidamente regularizado.
Exemplo 2: inexistência de inventário, em razão do falecimento do proprietário de um imóvel – o que também o torna irregular.
Uma proprietária de dois apartamentos faleceu, deixando apenas seus dois filhos. Ela era dona dos imóveis e o seu nome constava nas matrículas deles. Após o falecimento, seus filhos entraram em comum acordo para vender os apartamentos.
Quando localizaram os compradores, os irmãos foram impedidos de realizar a venda, pois os imóveis estavam irregulares, visto que ainda constavam no nome da sua falecida mãe.
Para regularizar esses imóveis e viabilizar a venda, os irmãos devem começar o processo realizando o inventário da mãe. O que requer a ajuda de um profissional especializado. Após isso, os bens deixados serão transferidos para seus nomes. Com um advogado atuando no caso, o próximo passo é averiguar a existência de eventuais dívidas e de todo patrimônio da inventariada para recolher o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD.
Com a partilha feita e os recolhimentos realizados, esse inventário ou a escritura pública de inventário extrajudicial deve ser registrado nas matrículas dos imóveis. Esse ato formaliza a transferência de propriedade da mãe aos filhos. Após o registro, os filhos poderão vender os imóveis, visto que estes estarão devidamente regularizados e já em seus nomes.
A sócia do escritório Petit Marchi Advocacia afirma que, em ambos os exemplos, há a necessidade de regularização do imóvel. Como visto, em cada situação de irregularidade, foi necessária a adoção de uma medida específica, motivo pelo qual é recomendável que as pessoas sempre busquem profissionais qualificados para ajudá-las.
Em quais ocasiões um imóvel é impedido de ser regularizado?
Como dito anteriormente, como cada município segue conforme estabelecido no seu Plano Diretor, algumas localidades podem apresentar regras mais duras. Mas, em linhas gerais, um imóvel não pode ser regularizado quando:
- Foi construído em logradouros e terrenos públicos;
- Seja ou tenha sido objeto de Operação Urbana ou Operação Interligada;
- Esteja junto a represas, córregos, faixas de escoamento de águas pluviais ou linhas de transmissão de energia de alta tensão;
- Foi atingido por melhoramento viário;
- Foi construído em loteamentos irregulares.
Em casos de usucapião, como funciona a regularização?
Nos últimos anos, o processo de regularização por usucapião ficou menos burocrático. Uma medida do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tornou possível realizar a usucapião em cartório, fora do Poder Judiciário. Ou seja, todo o processo pode ser feito no Cartório de Registro de Imóveis e exige a atuação de um advogado especializado.
Nesses casos, o imóvel também deve possuir matrícula no cartório competente e preencher algumas determinações da legislação vigente, como tempo de posse, que varia dependendo da modalidade. Na modalidade ordinária, por exemplo, o Código Civil prevê a posse do imóvel por 10 anos ininterruptos para aplicação da usucapião; enquanto em outras categorias o tempo de permanência é menor.
Outras determinações específicas também são consideradas, entre elas, a forma de posse do imóvel – se há qualquer oposição à presença do possuidor, no decorrer do tempo em que ele está no imóvel.
Samuel Duarte, tabelião no Cartório Paulista, pontua que, em regra, para comprovar que atuais possuidores do imóvel já residem no mesmo por um determinado período, serão necessários os documentos de identidade e certidões comprobatórias de estado civil das partes, a planta e memorial descritivo elaborado por um engenheiro civil, a assistência de um advogado nomeado pelas partes e as contas de consumo que comprovem a posse.
Sendo aplicável à usucapião, o possuidor do imóvel poderá, após o fim do trâmite, ter o seu direito de propriedade reconhecido, ou seja, ter o seu nome registrado como proprietário na matrícula do imóvel e regularizar a situação da propriedade.
Colaboração de Michele Louvores
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