Existe um mecanismo legal que, ao longo dos anos, permite aos indivíduos adquirir a propriedade de bens de forma singular — a usucapião. Esse é um processo jurídico complexo que exige uma série de requisitos para ser caracterizado.
Além disso, há diversos tipos desse instrumento que se alinham a cada situação específica. Por essa razão, antes de reivindicar a propriedade de um bem a qual já se obtém a posse, é preciso entender mais sobre todo o processo.
Quer compreender a usucapião? Acompanhe este texto e confira o que ela é e quais são os seus principais tipos!
O que é posse e propriedade?
Para entender o que é usucapião, é fundamental compreender a diferença entre posse e propriedade. A primeira se refere ao direito de utilizar um bem, mesmo que a pessoa não seja a proprietária legal dele.
Assim, ela é baseada na ocupação física e no exercício de controle sobre o bem — por exemplo, alguém aluga um apartamento e passa a residir nele. Desse modo, a posse pode ser adquirida de diversas maneiras, incluindo a compra, o aluguel, a herança ou, no contexto da usucapião, pela ocupação prolongada.
Já a propriedade é o direito por lei de ser o dono absoluto de um bem. Nesse caso, a pessoa que é a proprietária pode tomar decisões sobre o bem, como vendê-lo, alugá-lo, reformá-lo ou reivindicá-lo em qualquer momento.
Dessa maneira, no exemplo do apartamento alugado, o locatário possui apenas o direito de posse sobre o imóvel. Já o locador detém o direito de propriedade.
O que é usucapião?
Agora que você já sabe o que é posse e propriedade, é mais fácil entender o que é a usucapião. Ela é um instrumento jurídico que permite a aquisição da propriedade de um bem por meio da posse prolongada e ininterrupta, como visto, desde que atendidos determinados requisitos legais.
Vale destacar que a origem da palavra usucapião vem do latim usucapio, que significa tomar ou adquirir pelo uso. Além disso, a incorporação dessa medida à legislação brasileira tem raízes no direito romano, com as Leis das Doze Tábuas.
A sexta tábua dessas leis tratava das questões relacionadas à propriedade, incluindo o princípio fundamental que permitia a aquisição da propriedade por meio do uso. Ou seja, ele estabelecia que se alguém usasse um bem por um período estipulado sem que o verdadeiro dono reclamasse, o usuário adquiria a propriedade desse bem.
Isso refletia a importância atribuída à ocupação efetiva e ao uso de bens como base para a aquisição da propriedade. Dessa forma, esse preceito serviu como pilar para o desenvolvimento da usucapião ao longo da história jurídica.
Como funciona esse processo?
Para entender melhor o que é a usucapião, é fundamental compreender o funcionamento desse processo. Então vale a pena conhecer um exemplo prático.
Suponha que, há mais de 15 anos, Ana acreditasse, de boa-fé, que tinha direito a um terreno por meio de uma suposta compra anterior. Dessa maneira, ela decidiu começar a plantar e cultivar, tornando o local produtivo.
Além disso, Ana construiu uma pequena casa no local e passou a residir nele com sua família, pagando os tributos rurais e impostos associados ao terreno regularmente. Nesse cenário, ela pode buscar a usucapião como um meio de adquirir a propriedade legal do terreno.
Para tanto, Ana deve contratar um advogado especializado em direito imobiliário para iniciar um processo no qual o tribunal analisa todas as circunstâncias. Entre esses fatores, estão a posse contínua de Ana, a boa-fé, o uso produtivo do terreno e a falta de ação de Pedro como proprietário.
Portanto, se o tribunal considerar que todos os requisitos para a usucapião foram cumpridos, Ana poderá ser declarada a nova proprietária do terreno, de forma legalizada.
Quais são os tipos de usucapião?
Como você viu, o exemplo cita um terreno rural, que é um dos tipos de usucapião. Na prática, existem outros processos, cada um com características e requisitos diferentes.
A seguir, confira os principais tipos de usucapião!
Usucapião ordinária
A usucapião ordinária é aplicável a imóveis urbanos e requer a posse ininterrupta do bem por um período de 10 anos. Ainda, o possuidor deve estar de boa-fé, o que significa que ele acredita, de forma honesta, que tem o direito à propriedade do imóvel.
É necessário também que o possuidor tenha um justo título, que é um documento que confere direito sobre o imóvel, mesmo que não seja a propriedade. Por exemplo, João adquiriu um terreno de uma pessoa que, por engano, não possuía a propriedade legal do local.
João construiu uma casa no terreno e viveu lá por mais de 10 anos, pagando impostos e acreditando que era o proprietário legítimo. Após o período, ele entra com um processo de usucapião ordinária para adquirir legalmente a propriedade do terreno com base na posse contínua, na boa-fé e no justo título de compra.
Usucapião extraordinária
A usucapião extraordinária é aplicável quando o possuidor não tem nenhum título de propriedade ou quando não há prova de boa-fé. Nesse caso, é necessário um período de posse ininterrupta mais longo, geralmente de 15 anos.
A usucapião extraordinária reconhece a posse prolongada como um título de propriedade, independentemente da existência de documentação ou da boa-fé do possuidor. Por exemplo, Maria vive em uma propriedade que foi de sua família por gerações, mas ela não possui documentação formal que comprove sua situação.
Além disso, Maria vive na propriedade de forma contínua e ininterrupta há mais de 15 anos. Logo, ela decide entrar com um processo de usucapião extraordinária para obter a propriedade legal do terreno com base na longa posse, sem a necessidade de demonstrar boa-fé ou a existência de um justo título.
Usucapião rural
A usucapião rural se aplica a propriedades rurais e requer 5 anos de posse ininterrupta e uso produtivo do imóvel, ou seja, que o local seja utilizado para atividades agrícolas ou pecuárias. Ademais, é necessário que o possuidor esteja de boa-fé e não seja proprietário de outro imóvel rural ou urbano.
Por exemplo, José possui um sítio em uma área rural e realiza atividades agrícolas nele há mais de 5 anos. Ele acredita de boa-fé que tem o direito à propriedade, pois recebeu o terreno de seu avô, e entra com um processo de usucapião rural para obter a propriedade legal da área.
Usucapião especial urbana
A usucapião especial urbana é conhecida como usucapião familiar e se aplica a imóveis em cidades. Ela requer 5 anos de posse ininterrupta e não permite que o possuidor seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Esse tipo de usucapião visa a regularização fundiária de áreas urbanas e a proteção das famílias de baixa renda. Por exemplo, Luiza vive em uma casa em um bairro urbano há mais de 5 anos, não possui outro imóvel e vive com sua família.
Assim, ela decide entrar com um processo de usucapião para adquirir a propriedade legal do imóvel em que mora.
Usucapião especial de imóvel urbano para construção ou moradia
Esse tipo de usucapião permite que o possuidor reivindique um terreno vago ou subutilizado em área urbana para construção de moradia. Os requisitos incluem 5 anos de posse ininterrupta e a não propriedade de outro imóvel urbano ou rural.
Por exemplo, Carlos identifica um terreno vago em uma área urbana, constrói uma casa nele, vive com sua família no local por mais de 5 anos e não possui outra propriedade. Então Carlos entra com um processo de usucapião especial de imóvel urbano para obter a propriedade legal do terreno e da casa que construiu.
Usucapião coletiva
Esse tipo se aplica a áreas urbanas ocupadas por um grupo de pessoas que atendem aos requisitos da usucapião especial urbana. Desse modo, ela é importante para a regularização de áreas ocupadas por comunidades e cooperativas habitacionais.
Imagine uma comunidade de famílias de baixa renda que ocupa uma área urbana por mais de 5 anos, construindo casas e estabelecendo uma comunidade. O grupo decide entrar com um processo de usucapião coletivo para adquirir a propriedade legal da área em que vive, buscando a regularização fundiária e a segurança de suas residências.
Usucapião de bem móvel
Embora menos comum, em determinadas jurisdições, é possível aplicar a usucapião a bens móveis, como veículos e equipamentos. Os requisitos podem variar, mas geralmente envolvem posse ininterrupta e cumprimento dos prazos estabelecidos pela lei local.
Por exemplo, João possui uma motocicleta que usa regularmente há mais de 5 anos, acreditando que o veículo é seu por tê-lo comprado de outra pessoa que alegava ser o dono. Diante disso, ele entra com um processo de usucapião de bem móvel para obter a propriedade legal da motocicleta.
Quais são os requisitos para usucapião?
Você já entendeu que existem requisitos específicos para que a usucapião seja caracterizada, certo? Dessa maneira, é importante estar ciente sobre esses fatores.
Na sequência, veja os critérios para a usucapião!
Posse contínua e ininterrupta
A posse contínua e ininterrupta significa que o possuidor deve ocupar o bem de forma constante e sem interrupções ao longo do período exigido pela lei. Isso implica que o possuidor não pode abandonar o bem ou permitir que terceiros o ocupem durante esse período.
Prazo de posse
Cada tipo de usucapião tem um prazo mínimo de posse estabelecido por lei, que pode variar de acordo com a legislação local. Por exemplo, enquanto na usucapião rural esse período é de 5 anos, a ordinária é de 10 anos.
Boa-fé
Como explicado, a boa-fé significa que o possuidor deve acreditar, de forma honesta, que tem o direito à propriedade do bem, mesmo que esse direito seja contestado. No entanto, vale lembrar que esse requisito não é necessário em todos os processos de usucapião.
Justo título
Em determinados tipos de usucapião, é exigido um justo título, que é um documento que não confere a propriedade do bem, mas sim, certo direito. Dessa forma, ele pode ser um recibo de compra e venda, por exemplo.
Ausência de oposição
Durante o período de posse, o possuidor não deve enfrentar oposição legal do proprietário do bem. Isso significa que ele não pode tomar medidas legais para reaver o bem ou contestar a posse do usucapiente.
Utilização produtiva
Em casos de usucapião rural, é comum a exigência de que o bem seja utilizado de forma produtiva para atividades agrícolas ou pecuárias. Essa é uma forma de demonstrar a função social da propriedade.
Não propriedade de outro bem
Há tipos de usucapião em que é necessário que o possuidor não seja proprietário de outro imóvel, seja ele rural ou urbano. Por exemplo, suponha que uma pessoa deseje entrar com um processo de usucapião especial urbano para adquirir a propriedade de sua casa atual.
No entanto, ela já é dona de um terreno rural. Nesse caso, o indivíduo não atende ao requisito de não ser proprietário de outro imóvel.
Como entrar com o pedido judicial de usucapião?
Agora que você entende sobre a usucapião, é possível que tenha interesse em saber como entrar com o pedido judicial para obter esse instrumento.
Confira o passo a passo!
Identificação do caso de usucapião e requisitos
O primeiro passo é identificar qual tipo específico de usucapião é aplicável ao caso em questão. Além disso, é necessário entender se a situação cumpre todos os requisitos específicos, o que é fundamental para o sucesso do processo.
Contratação de um advogado
O advogado desempenha um papel-chave na análise do caso, na coleta de documentação relevante e na garantia de que todos os procedimentos legais sejam seguidos corretamente. Ademais, ele atuará como o representante legal do usucapiente durante todo o processo.
Elaboração da petição inicial
O advogado será responsável por preparar a petição inicial, um documento legal formal que será apresentado ao tribunal. Essa petição detalhará o caso, incluindo os fundamentos legais, os pedidos específicos e toda a documentação de suporte necessária.
Tramitação do processo
Após a apresentação da petição inicial, o processo de usucapião seguirá sua tramitação. Isso envolverá diversas etapas, incluindo a notificação do proprietário legal do imóvel, dos confrontantes da propriedade, a análise de provas documentais, bem como possíveis audiências para ouvir testemunhas e argumentos das partes envolvidas.
Decisão judicial
Após uma análise completa do processo, o tribunal emitirá uma decisão. Se todos os requisitos forem cumpridos e não houver contestação bem-sucedida, a justiça concederá a usucapião. Nesse momento, o usucapiente se tornará o novo proprietário legal do imóvel em questão.
Compreender os tipos de usucapião e os requisitos associados a cada um pode auxiliar a tomar decisões informadas sobre aquisição e regularização de propriedades. Desse modo, é possível evitar eventuais complicações na justiça.
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